Modos de se fAzer uM progrAMA coMunitário
Existem várias formas de se fazer rádio ou televisão. Mas o que não
pode faltar numa emissora comunitária é música, jornalismo, serviços e
informação.
1. Um programa de rádio ou TV pode conter os seguintes gêneros:
Informativo - Educativo - De entretenimento - Participativo - Cultural - Religioso - De mobilização social - Publicitário...
2. Ainda pode ser:
Infantil - Juvenil - Feminino - Da terceira idade - Rural - Urbano - Sindical ...
3. Criatividade
Seja ágil. Invente. Crie. Ao fazer um programa mescle música com
informação, entrevistas, reportagens, efeitos sonoros, e, no caso da
TV, visuais, . Ninguém suporta uma programa monótono. Seja vibrante.
Comunicação é energia. Valorize cada palavra. Elas devem passar a
emoção que carregam. Não "leia" um texto - dramatize,
invente, crie.
4. Sabe com quem está falando?
Saiba para quem está se dirigindo. Qual é o seu público? É gente rica
ou pobre? Homens ou mulheres? Em que trabalham? Não esqueça: é o
ouvinte quem põe o sentido das coisas, não a mensagem. O ouvinte só
escuta o que lhe interessa. Além do mais tem o clima. As pessoas têm
sentimentos e eles favorecem ou atrapalham a recepção de mensagens.
Depois de brigar com a namorada fica difícil escutar um debate
político...
5. Linguagem
Não existe um "português correto". Não exija dos que
fazem rádio comunitária que falem o português ensinado nas escolas.
Este português que dizem ser o "correto"; é uma forma
da elite humilhar as pessoas. De toda população brasileira somente uma
centena de pessoas sabe falar esta língua! Dona Maria que conhece tudo
sobre doces, ou Seu Amaro, um especialista em construções, um
mestre-de-obras de primeira grandeza, conhecem muito bem o seu ofício
mas não tiveram a oportunidade de estudar numa escola. Por isso não
sabem falar este "português correto". Eles, com
certeza, podem ter um programa na rádio, falando do jeito deles. O povo
brasileiro é um povo de várias línguas e muitos sotaques. Cada qual ao
seu jeito deve ter espaço na rádio comunitária. Se a rádio comunitária
abrir espaço unicamente para aqueles que sabem falar o "português correto" então não vai ter ninguém para
falar.
Busque uma linguagem simples. Não complique. Não faça da emissora uma
tribuna política ou religiosa. A linguagem deve ser íntima - "você, que está me escutando"...
Não queira corrigir o modo de falar do povo. O jeito de cada um se
exprimir é o jeito da pessoa se comunicar. Não imite o sotaque
alienígena para se mostrar avançado. Fale como sua gente, a gente da
comunidade.
Use e abuse do bom humor.
6. Dicção
É muito importante saber expressar cada palavra. Cada qual ao seu
jeito, na sua língua, no seu sotaque, deve exprimir as palavras. Todos
aqueles que vão fazer um programa devem saber disto: as palavras têm
começo meio e fim. Mesmo que seja uma palavra que faz parte do
vocabulário local e não conste do dicionário. Por exemplo, ocê. O som
deve sair inteiramente. E quando for no plural, atenção para o esse.
Então ficaria: ocês. Mas não esqueça de pronunciar a letra final. Sejam
palavras conhecidas, como casa e casas, ou regionalistas, como oxente,
tchê... Palavra é som. Se falar incompleto ninguém entende.
7. Leitura de texto
Quando for ler um texto, não leia o texto! Faça com que ele tenha vida,
dê energia as palavras escritas. Um texto lido fica um porre, um
velório, um discurso monótono.
8. Não copie a programação das emissoras comerciais
As emissoras comerciais têm compromisso com o lucro, com negócios. Ela
não está preocupada com a questão social e muito menos com a sua
comunidade. Colocar na rádio comunitária uma programação musical ou
jornalística igual a de uma rádio comercial é uma agressão à
comunidade. Seja criativo, invente, faça uma rádio conforme seu bairro,
sua vila, sua cidade, e não igual às outras rádios.
9. Música
O compromisso de uma emissora comunitária, nunca esqueça, é com a
comunidade. Identifique na região os artistas, os músicos, e
compositores. Toque as músicas de gente da região, da sua cidade, do
seu estado, do Brasil. Toque música de qualidade. Se tocar música
internacional, que seja de qualidade. Se o ouvinte pedir a música de
sucesso, a que está tocando nas outras rádios ou na televisão,
questione, reflita, não faça a emissora comunitária ser igual a
comercial. Não esqueça que as outras rádios recebem dinheiro das
gravadoras para tocar estas músicas que fazem sucesso. As gravadoras
determinam a programação das rádios comerciais e assim o gosto do
público, fazendo com que o povo compre aquilo que elas querem. A rádio
comunitária não pode se dobrar a isto. Ela tem que estar ligada à
cultura da região, aí incluindo o folclore e os artistas locais. É sua
obrigação divulgar a cultura local.
10. Cultura
Divulgar a cultura local é missão da rádio comunitária. Se na sua
programação a rádio toca somente música de sucesso ou o que está nas
paradas é porque não é rádio comunitária. É importante que a rádio
transforme cada programa num difusor cultural. Para isso é importante
que os produtores dos programas pesquisem, leiam sobre o assunto o
máximo possível, informem-se, aprendam cada vez mais, para que possam
transmitir aos seus ouvintes. A rádio comunitária deve ser educativa.
Por exemplo, quando tocar música de determinado cantor, diga quem ele é
, fale sobre suas obras, a importância do seu trabalho; se for da
região, inclua entrevistas,... Dê riqueza ao trabalho, com informações.
Do mesmo modo, explique ao povo da região que a rádio comunitária não
vai tocar, digamos "dance music", porque é uma música
que já toca nas outras rádios, é um lixo importado, não tem a ver com a
realidade local... Dê os motivos. Se não sabe, procure aprender, ouça
quem entende do assunto. Informe-se. Não adianta botar uma rádio no ar
e não saber o que está fazendo. Não importa o tema, aprenda, leia,
estude mais, converse com quem entende... Não permita que sua rádio
seja pobre culturalmente, só repetindo o que os outros já fazem.
Divulgue as manifestações folclóricas locais.
11. Jornalismo
A comunidade é sempre notícia. Em cada rua está acontecendo alguma
coisa, as pessoas são notícias. Mostre o que está acontecendo, alerte
para os problemas e apresente propostas de solução do povo. Promova
debates, discuta as questões locais e nacionais, sempre colocando gente
da comunidade para discutir. Questione as autoridades sobre os
problemas locais; chame todos os partidos políticos para que dêem sua
opinião sobre os problemas locais ou nacionais; coloque-os em confronto
com a comunidade.
A rede Globo determinou um padrão, um modo de se fazer jornalismo no
Brasil. É um modo que todo mundo copia. Fuja dele. O jornalismo global
é adequado a uma emissora que tem como único objetivo promover o lucro
do seu dono.
Na comunitária, coloque a sua língua e o seu sotaque. Não fale como
jornalista da Globo e muito menos aja como ele. Seja sensível com as
pessoas e à realidade local. Uma emissora comunitária não pode ser
sensacionalista ou vampira. Ela deve estar consciente que faz parte da
comunidade e, portanto, o que fizer está fazendo por si, pelos seus
integrantes.
12. Serviço.
Mantenha um sistema de serviço constante. Fale das reivindicações da
comunidade. Da assembléia na fábrica. Divulgue a oferta de empregos na
região, dê os nomes de quem procura emprego. Mande avisos, recados,...
Coloque um boletim sobre cuidados básicos com a saúde, sobre qualidade
de vida, alimentação... Não esqueça, a emissora comunitária existe para
atender aos interesses do povo.
13. Entrevistas
Quando for entrevistar alguém não seja arrogante, o sabe tudo. Mesmo
que o entrevistado seja um bandido ou um mentiroso, procure mostrar
estas mentiras e seu lado mafioso, mas não discuta nem se mostre o
gostosão. Se você entende do assunto deixe que ele se enrede nas suas
perguntas e não nas suas opiniões. Seja sutil. Se é um programa de
entrevistas e você sabe antecipadamente que o entrevistado andou
aprontando, é um ladrão, então estude, prepare-se, e ataque mas usando
informações precisas, com base em documentos. Nunca diga: "-
eu ouvi dizer que o senhor andou levando dinheiro". Em
jornalismo não se coloca "ouvi dizer". Ou você diz
qual foi a fonte, ou então fala de outro modo: "- recebemos
informações não-oficiais, ou, por fonte oficial, que não posso revelar
o nome, que o senhor teria se apropriado...". Há uma diferença
muito grande entre as duas perguntas: no primeiro caso você acusou o
entrevistado de ladrão; no segundo, levantou a possibilidade, através
de uma denúncia, não confirmada, de que ele poderia ser um ladrão. No
primeiro caso, você pode ser processado por calúnia. No segundo, não.
Mas ainda assim pode ser ruim, porque o entrevistado pode pedir provas,
e se você não tiver perde seu respeito diante dos ouvintes.
Em suma, nunca acuse ninguém de nada, sem ter provas. Toda acusação sem provas é uma calúnia, e aí dá processo.
Programas policiais
Nenhuma rádio comunitária pode ter programa policial. Deixe isso para
as rádios comerciais que se alimentam da miséria humana. Faça, pelo
contrário programas/debates sobre direitos humanos, qualidade de vida...
Temas sociais
É importante que a rádio comunitária aborde questões que dizem respeito
à comunidade e ao país. Promova debates sobre questões como reforma
agrária, direitos humanos, educação, aborto, política, saúde, sem-teto,
democratização dos meios de comunicação... Procure sempre colocar os
dois lados do tema - aqueles que são contra e aqueles que são
favoráveis.